Candente na noite, Aquela cujo destino se cumpre no roubar dos corações, avançava ao encontro da brisa marinha. O corpo sibilante espartilhado no sobretudo fechado, descaía como um véu sob a face espumada das águas, semeando-se descalço no difícil caminho.
De soslaio, serpenteando um ritmo, o penedo que norteia a falésia cobre-se também de prata, fazendo-se escutar esmagado nas vagas que nunca o cobrem totalmente. Mas Ela avança, insuspeita para Ele, que está longe demais. Corre mais depressa do que lhe permite a razão e, ainda em terra se afoga.
Fica um nome gravado na rocha, por longos anos, a dança moribunda inscrita na areia, o vestido branco flutuando na maré vazia. E Ela nua, fria, lembrada com um nó no estômago.
Aguardavam um pelo outro, fugindo cada qual de si próprio. Mal se conheciam, mas isso bastava.
No primeiro dia em que se descobriram não havia saudade. Era Ele dela e Ela dele; um, sem saber do outro, desde sempre, em correria um para o outro.
Ainda criança, descansava neles o amor; tinha o rosto da mãe, da irmã, do avô, mas não se esgotava aí - faltou sempre um outro que esgotasse o amor; um nada de parte a parte e um desejo sem fim.
Naquele dia chovia. E havia melancolia. A multidão tinha um olhar, cabelos longos, pele branca, muito branca, um vestido escuro, uma silhueta. Naquela noite adormeceu o sono.
«Posso apagar a luz?»
«Não, deixa-a mais um bocado...»
Estava diante dela, e Ela diante dele. O desejo entretecia suavemente o universo, atraindo-os para o seu centro. Apressou-se a beijá-la, porque ela queria ser beijada depressa. Os dentes batiam no dentes, a boca retraía-se ao choque, mas de novo corria procurando a outra, sem se descolarem os lábios, o mundo ruía no silêncio gritante da rua, o sol e a lua esbatiam o tempo, simultaneamente, noite e dia não eram nem uma coisa nem outra, mas a síntese transeunte do amor. Ninguém chamava. Ninguém os reconhecia, tão altos, encimando a torre dourada. O medo era pequeno, insignificante. Acima das cabeças o céu estirava uma fina película, trespassada mais adiante. Ao longe, chovia, abaixo das nuvens; todos se guardavam da chuva dentro das grotescas casas de xisto. E o vento uivava nas ruas, dobrava os ramos. Mas naquele egocentrismo dual, não havia para onde ir. Ele era dela e Ela era dele.
«Amo-te. Sempre te amarei. Sempre te amei, meu amor.»
As lágrimas corriam dentro do peito, florescendo num sorriso que tudo iludia. Mas eram felizes, tão felizes sem saber.
As noites longas eram escassas para suportar o desejo. Por isso escreviam-se cartas; palavras a mais para o vazio, vazias demais para o amor. Ao serem lidas parecia que Ela era mais importante que Ele, e Ele importava mais que Ela, parecia que Deus os havia abençoado, deixando a vida de um ao cuidado do outro. E Ela já era quase tudo. Ele não podia viver longe dela. Queriam morrer nos braços um do outro, mas nenhum deles tinha braços; no seu lugar expandiam-se dois céus, dois sóis, duas luas, dois abismos suspirantes. E dois mundos gravitavam dentro do amor, em torno dele. Nada disto se via, nem se podia auscultar, mas sucedia a par da timidez de ambos, à medida em que crescia a saudade.
Naquele dia, começou Ele a morrer, e era Ela quem o matava, devagar.
Naquele dia, a sombra dele corria, mais depressa que o corpo -;
aluía o preto e branco nas flores, pelas cores, adiantando-se a descompasso nas reentrâncias da parede, submersa no beco onde não alcançava a manhã.
Naquele dia, Ela saiu, levando-lhe o coração.
E desde aquele dia, Ela ficou assim, sem que Ele a conseguisse mover -;
uma nuvem de pedra. « Turner...», exclamou Ele. O temporal junto à costa, o céu feito de chuva, a penha mergulhada no inverno despedindo-se do Outono!... A minha vida é um vendaval que o mar tem de engolir, uma nau fundeada com a praia ao largo, apressou-se a escrever.
Abria então o reposteiro negro, e de púrpura se tingia a luz interior, guardada como um segredo. De dentro do clarão purpurado, entreabriam-se miríades de flores inclusas numa última que as segurava ao centro, transparecendo-o em espiral para o seu íntimo diáfano, surdo-mudo, paralisado, quase totalmente, gritando ainda no silêncio do pensamento – a beleza!
Norteando a insónia, que o pregava à falta dela como a uma cruz, alongava-se do seio da cor, transparecida de nevoeiro, a falésia sedenta de mar. E todas as vozes se misturavam perigosamente na sua, que chamava por Ela, tão próxima, pulsando ali, ao dobrar de cada instante, tramando o manto da noite.
Queria esquecê-la, só, mas também vê-la, uma última vez, morrer aí sem adeus ou saudade, com Ela nos braços e por dentro dela; ao longo dos cabelos, perfumando-a num fulgor ansioso, para que Ela se lembrasse do que ainda não via, e a eternidade selasse num derradeiro ribombo, a certeza de que Ele era dela e Ela era dele.
E às vezes parecia que tudo regressava com revigoradas forças, definitivamente. E era claro, tão claro, por que a vida era Ela ser dele e Ele dela -: tão longe, ninguém se arriscava e o amor tinha de ser verdade.
Mas a tempo Ela lhe doía. E de novo se enchia o quarto, a cidade, toda a vida com a sua ausência pregnante. De novo o medo ladeava de noite os passos em frente, e, para súplica dele, o abraço cingia-se em dois trémulos membros vorando o vazio -;
Ela à distância das mãos, por toda a cama, suspirante, perfurava a dor com nova dor, até não se sentir mais nada, semeava o futuro sem expectativa e crescia, dolorosamente, de encontro ao caos enclausurado no peito, rodopiando com uma segurança felina ao longo do parapeito que Ele queria saltar.
Contra os dias de futuro difícil, avançava Ele com chuva pela frente, aligeirando o andar, atravessava sem olhar, sem medo das ruelas estreitas onde se esconde o fedor da espécie, nem da voz demoníaca que o distraía do sentido.
E Ele morria se não a visse.
Mas Ela resistia e deixava-o cair.
Ele chorava. Chorava, porque era Dela.
Já perdido ainda temia a perdição. Tremia só de pensar que tudo podia levar o desespero, não poupando sequer o tempo para que das antigas frutificassem novas viagens.
Mas havia tempo, muito tempo para esquecer. Tempo para esperar – «A vida continua» – pois, como se vê, a vida vence sempre, e continua, brandindo o moribundo numa centelha de vontade. Como se percebe, é tudo uma questão de tempo.
O problema era o tempo, a espera, o alcance do sofrimento. O problema era o amor. Era Ele estar fora dele, por culpa dela -;
tudo uma mentira. Um ser à beira de cair noutro, limiando o fim. Foi tudo um nada presente, do tamanho do tempo. Um vislumbre do caos a perder o medo, a distender a vida para lá dela, para lá deles, numa esperança imortal e cega. Foi Ela longe, e o mundo a acabar aos poucos, desabando ferido de morte, persistente, nauseante e pesado. Apenas um pretexto para que a vida vencesse onde não se imaginava que houvesse vida. Foi só um instante.
Mas nos ouvidos dele uma língua se enrolava. O segredo escorria fluido, escumando no silêncio sem cor, a cor do silêncio, altissonante – é a voz dela lampejada de murmúrios, aspergida num só tom, num só sentido partilhado na frase -;
«Agora somos só nós, outra vez. No fundo nunca deixámos de ser nós... que valemos por tudo o que virá.»
As palavras dela, como faróis mediando dois abismos, traziam as margens para o rio, brotado da nascente morta, abaixo da última profundidade da terra -; um firmamento de sangue coado, atravessado no relâmpago que ilumina a sombra.
E de desejos estranhamente seus, agarra-se Ele ao vestido dela, como a uma bóia de salvação.
Esvoaçam de fulvas asas, as harpias envenenadas de futuro – numa esqualidez de marfim puído, quase metálica, esmaltada ao meio da noite -, e só quem sonha os vê trepar os cabelos que pendiam dos confins da vida, à margem do tempo –;
«A todo o vapor, dá-lhe esperança, uma dose excessiva.»
«Finalmente chegou a medicação. Terá conseguido passar na fronteira controlada pelas tropas de ocupação.
«Eu começava já a pensar no pior. Com este tempo, mesmo que estivessem perto, dificilmente conseguiriam viajar.» «Isto só funciona se tomares muito.»
Falavam todos ao mesmo tempo, como porteiras desamordaçadas após um mês de cativeiro. Mas todos queriam dizer o mesmo -: «Tudo recomeçou» -;
a Primavera florida numa janela para lá do inferno, entretecida nele, lânguida, devota ao ciclo em frágeis botões estacados na geada, confiante do seu tempo, que chegará.
Era como se o sol estivesse dentro dele, dentro dela, dentro de tudo o que se despedia na subida. Ele só tinha de ser o que havia para ser; tinha de adormecer para acordar junto a Ela; tinha de morrer para ter vivido por Ela.
Era preciso tê-la para sempre, sem pensar muito nisso. Queria que Ela fosse o que só Ele podia ver, e lhe oferecesse apenas o que implorava o desejo Dele -: o rosto dela do outro lado da nuvem espessa, a sua voz no extremo distante da linha, falando-lhe da vida.
Mas os sussurros longos dilatavam-se, e só o silêncio soprava, transindo os espectros que, bordejando a torrente ardente, guardavam o bosque infernal num colete brumante.
No flanco aberto onde se estarrecia a noite, estiolada duma pouca luz, deixa Ele mais um suspiro por Ela, desalastrando o próprio corpo até Ela o tomar. Das lágrimas que mancharam de brilho a escuridão do vale, reflui enfim um precioso continente na profundidade do mar. E aí, só aí, onde ninguém os pode ver, podem ser escravos um do outro e morrer, naturalmente - Ele dela e Ela dele, sem que ninguém se atreva a dividi-los.
De soslaio, serpenteando um ritmo, o penedo que norteia a falésia cobre-se também de prata, fazendo-se escutar esmagado nas vagas que nunca o cobrem totalmente. Mas Ela avança, insuspeita para Ele, que está longe demais. Corre mais depressa do que lhe permite a razão e, ainda em terra se afoga.
Fica um nome gravado na rocha, por longos anos, a dança moribunda inscrita na areia, o vestido branco flutuando na maré vazia. E Ela nua, fria, lembrada com um nó no estômago.
Aguardavam um pelo outro, fugindo cada qual de si próprio. Mal se conheciam, mas isso bastava.
No primeiro dia em que se descobriram não havia saudade. Era Ele dela e Ela dele; um, sem saber do outro, desde sempre, em correria um para o outro.
Ainda criança, descansava neles o amor; tinha o rosto da mãe, da irmã, do avô, mas não se esgotava aí - faltou sempre um outro que esgotasse o amor; um nada de parte a parte e um desejo sem fim.
Naquele dia chovia. E havia melancolia. A multidão tinha um olhar, cabelos longos, pele branca, muito branca, um vestido escuro, uma silhueta. Naquela noite adormeceu o sono.
«Posso apagar a luz?»
«Não, deixa-a mais um bocado...»
Estava diante dela, e Ela diante dele. O desejo entretecia suavemente o universo, atraindo-os para o seu centro. Apressou-se a beijá-la, porque ela queria ser beijada depressa. Os dentes batiam no dentes, a boca retraía-se ao choque, mas de novo corria procurando a outra, sem se descolarem os lábios, o mundo ruía no silêncio gritante da rua, o sol e a lua esbatiam o tempo, simultaneamente, noite e dia não eram nem uma coisa nem outra, mas a síntese transeunte do amor. Ninguém chamava. Ninguém os reconhecia, tão altos, encimando a torre dourada. O medo era pequeno, insignificante. Acima das cabeças o céu estirava uma fina película, trespassada mais adiante. Ao longe, chovia, abaixo das nuvens; todos se guardavam da chuva dentro das grotescas casas de xisto. E o vento uivava nas ruas, dobrava os ramos. Mas naquele egocentrismo dual, não havia para onde ir. Ele era dela e Ela era dele.
«Amo-te. Sempre te amarei. Sempre te amei, meu amor.»
As lágrimas corriam dentro do peito, florescendo num sorriso que tudo iludia. Mas eram felizes, tão felizes sem saber.
As noites longas eram escassas para suportar o desejo. Por isso escreviam-se cartas; palavras a mais para o vazio, vazias demais para o amor. Ao serem lidas parecia que Ela era mais importante que Ele, e Ele importava mais que Ela, parecia que Deus os havia abençoado, deixando a vida de um ao cuidado do outro. E Ela já era quase tudo. Ele não podia viver longe dela. Queriam morrer nos braços um do outro, mas nenhum deles tinha braços; no seu lugar expandiam-se dois céus, dois sóis, duas luas, dois abismos suspirantes. E dois mundos gravitavam dentro do amor, em torno dele. Nada disto se via, nem se podia auscultar, mas sucedia a par da timidez de ambos, à medida em que crescia a saudade.
Naquele dia, começou Ele a morrer, e era Ela quem o matava, devagar.
Naquele dia, a sombra dele corria, mais depressa que o corpo -;
aluía o preto e branco nas flores, pelas cores, adiantando-se a descompasso nas reentrâncias da parede, submersa no beco onde não alcançava a manhã.
Naquele dia, Ela saiu, levando-lhe o coração.
E desde aquele dia, Ela ficou assim, sem que Ele a conseguisse mover -;
uma nuvem de pedra. « Turner...», exclamou Ele. O temporal junto à costa, o céu feito de chuva, a penha mergulhada no inverno despedindo-se do Outono!... A minha vida é um vendaval que o mar tem de engolir, uma nau fundeada com a praia ao largo, apressou-se a escrever.
Abria então o reposteiro negro, e de púrpura se tingia a luz interior, guardada como um segredo. De dentro do clarão purpurado, entreabriam-se miríades de flores inclusas numa última que as segurava ao centro, transparecendo-o em espiral para o seu íntimo diáfano, surdo-mudo, paralisado, quase totalmente, gritando ainda no silêncio do pensamento – a beleza!
Norteando a insónia, que o pregava à falta dela como a uma cruz, alongava-se do seio da cor, transparecida de nevoeiro, a falésia sedenta de mar. E todas as vozes se misturavam perigosamente na sua, que chamava por Ela, tão próxima, pulsando ali, ao dobrar de cada instante, tramando o manto da noite.
Queria esquecê-la, só, mas também vê-la, uma última vez, morrer aí sem adeus ou saudade, com Ela nos braços e por dentro dela; ao longo dos cabelos, perfumando-a num fulgor ansioso, para que Ela se lembrasse do que ainda não via, e a eternidade selasse num derradeiro ribombo, a certeza de que Ele era dela e Ela era dele.
E às vezes parecia que tudo regressava com revigoradas forças, definitivamente. E era claro, tão claro, por que a vida era Ela ser dele e Ele dela -: tão longe, ninguém se arriscava e o amor tinha de ser verdade.
Mas a tempo Ela lhe doía. E de novo se enchia o quarto, a cidade, toda a vida com a sua ausência pregnante. De novo o medo ladeava de noite os passos em frente, e, para súplica dele, o abraço cingia-se em dois trémulos membros vorando o vazio -;
Ela à distância das mãos, por toda a cama, suspirante, perfurava a dor com nova dor, até não se sentir mais nada, semeava o futuro sem expectativa e crescia, dolorosamente, de encontro ao caos enclausurado no peito, rodopiando com uma segurança felina ao longo do parapeito que Ele queria saltar.
Contra os dias de futuro difícil, avançava Ele com chuva pela frente, aligeirando o andar, atravessava sem olhar, sem medo das ruelas estreitas onde se esconde o fedor da espécie, nem da voz demoníaca que o distraía do sentido.
E Ele morria se não a visse.
Mas Ela resistia e deixava-o cair.
Ele chorava. Chorava, porque era Dela.
Já perdido ainda temia a perdição. Tremia só de pensar que tudo podia levar o desespero, não poupando sequer o tempo para que das antigas frutificassem novas viagens.
Mas havia tempo, muito tempo para esquecer. Tempo para esperar – «A vida continua» – pois, como se vê, a vida vence sempre, e continua, brandindo o moribundo numa centelha de vontade. Como se percebe, é tudo uma questão de tempo.
O problema era o tempo, a espera, o alcance do sofrimento. O problema era o amor. Era Ele estar fora dele, por culpa dela -;
tudo uma mentira. Um ser à beira de cair noutro, limiando o fim. Foi tudo um nada presente, do tamanho do tempo. Um vislumbre do caos a perder o medo, a distender a vida para lá dela, para lá deles, numa esperança imortal e cega. Foi Ela longe, e o mundo a acabar aos poucos, desabando ferido de morte, persistente, nauseante e pesado. Apenas um pretexto para que a vida vencesse onde não se imaginava que houvesse vida. Foi só um instante.
Mas nos ouvidos dele uma língua se enrolava. O segredo escorria fluido, escumando no silêncio sem cor, a cor do silêncio, altissonante – é a voz dela lampejada de murmúrios, aspergida num só tom, num só sentido partilhado na frase -;
«Agora somos só nós, outra vez. No fundo nunca deixámos de ser nós... que valemos por tudo o que virá.»
As palavras dela, como faróis mediando dois abismos, traziam as margens para o rio, brotado da nascente morta, abaixo da última profundidade da terra -; um firmamento de sangue coado, atravessado no relâmpago que ilumina a sombra.
E de desejos estranhamente seus, agarra-se Ele ao vestido dela, como a uma bóia de salvação.
Esvoaçam de fulvas asas, as harpias envenenadas de futuro – numa esqualidez de marfim puído, quase metálica, esmaltada ao meio da noite -, e só quem sonha os vê trepar os cabelos que pendiam dos confins da vida, à margem do tempo –;
«A todo o vapor, dá-lhe esperança, uma dose excessiva.»
«Finalmente chegou a medicação. Terá conseguido passar na fronteira controlada pelas tropas de ocupação.
«Eu começava já a pensar no pior. Com este tempo, mesmo que estivessem perto, dificilmente conseguiriam viajar.» «Isto só funciona se tomares muito.»
Falavam todos ao mesmo tempo, como porteiras desamordaçadas após um mês de cativeiro. Mas todos queriam dizer o mesmo -: «Tudo recomeçou» -;
a Primavera florida numa janela para lá do inferno, entretecida nele, lânguida, devota ao ciclo em frágeis botões estacados na geada, confiante do seu tempo, que chegará.
Era como se o sol estivesse dentro dele, dentro dela, dentro de tudo o que se despedia na subida. Ele só tinha de ser o que havia para ser; tinha de adormecer para acordar junto a Ela; tinha de morrer para ter vivido por Ela.
Era preciso tê-la para sempre, sem pensar muito nisso. Queria que Ela fosse o que só Ele podia ver, e lhe oferecesse apenas o que implorava o desejo Dele -: o rosto dela do outro lado da nuvem espessa, a sua voz no extremo distante da linha, falando-lhe da vida.
Mas os sussurros longos dilatavam-se, e só o silêncio soprava, transindo os espectros que, bordejando a torrente ardente, guardavam o bosque infernal num colete brumante.
No flanco aberto onde se estarrecia a noite, estiolada duma pouca luz, deixa Ele mais um suspiro por Ela, desalastrando o próprio corpo até Ela o tomar. Das lágrimas que mancharam de brilho a escuridão do vale, reflui enfim um precioso continente na profundidade do mar. E aí, só aí, onde ninguém os pode ver, podem ser escravos um do outro e morrer, naturalmente - Ele dela e Ela dele, sem que ninguém se atreva a dividi-los.
1 comentário:
Eu recuso-me a pensar que a vida vence, é uma discórdia... Costumo misturar vida com destino... E acredito ke no que toca ao amor, o destino deixa de existir a partir do momento em que o amor começa...
Confuso? Talvez para alguns... mas para quem escreve como o stor acho que não... Um abraço stor ;)
Enviar um comentário